quinta-feira, 23 de novembro de 2017

AS MESTRAS DE SANTA LUZIA

As mestras de Santa Luzia

    Um dos momentos marcantes da minha infância aconteceu quando comecei a estudar no Grupo Escolar “Dr. Cunha Lima”, em Remígio. Tudo ia muito bem, até que um boato causou-me um mega susto. Espalharam que só poderia continuar indo à escola, quem tivesse sapato. Era uma exigência da diretora. O nome dela era Nevinha. Entrei em pânico. Eu não tinha sapato. Longe de mim a ideia de interromper os estudos que estavam na verdade apenas no começo. Enchi-me de coragem e fui, eu mesmo tentar reverter a situação. Preparei-me. Ensaiei várias falas, mas de tão nervoso acabei esquecendo todos os scripts e indo direto ao assunto. Mas suava em bicas e tremia feito vara de marmeleiro. Comecei dizendo que era pobre e que minha mãe não podia comprar sapatos para mim.

    Comecei a chorar. Não queria sair do Grupo e que ela permitisse a minha entrada com as alpercatas que eu usava. Qual não foi a minha surpresa quando aquela jovem dirigente abraçou-me com um carinho maternal e, com suavidade disse-me que não tinha problemas e que eu estava dispensado dos tais sapatos. Exultei de alegria. Consegui!

    Foi essa mesma Dona Nevinha que me incentivou a dar os primeiros passos no sentido do gosto pela leitura. Na sala da diretoria havia uma estante de madeira escura com prateleiras repletas de livros destinados ao público infanto-juvenil. A gente escolhia o livro, levava para casa, lia e no momento da devolução ela pedia que contássemos a estorinha. Feito isso, estávamos habilitados a escolher outro livro e assim por diante. Foi a partir dali que nasceu o meu fascínio pela magia da leitura.

   Dona Nevinha, mais duas irmãs que também eram professoras, vieram de Santa Luzia. Desconheço os motivos que as trouxeram para trabalhar em Remígio. Uma chamava-se Berenice e a outra, parece que era Marinalva ou algo parecido. Todas muito caprichosas com tudo que dizia respeito ao grupo escolar, principalmente quando das datas comemorativas, notadamente o dia 7 de setembro. Trouxeram idéias que resultaram em inovações no fazer pedagógico.

     O fato é que as mestras de Santa Luzia deram uma grande contribuição à história da Educação de parcela de remigenses que teve o prazer de desfrutar do conhecimento e da competência daquelas profissionais. Para elas o trabalho no Cunha Lima significava mais do que um emprego.Tinham-no como missão. Algo intangível. Elas, como os demais educadores, tinham um sonho. O sonho de um mundo em que houvesse respeito à dignidade humana.

     Não sei se ainda são vivas, mas tenho certeza que deixaram marcas indeléveis na história de uma geração de remigenses. Pelo menos na memória daquele sambudo magrelinho que por pouco não teve sua carreira de estudante interrompida por não possuir um lustroso par de sapato. Felizmente tudo não passou de boato. Felizmente!


Francisco de Assis Melo
João Pessoa/PB em novembro de 2017.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

VIVENDO & APRENDENDO



"Os tempos passam e com eles vêm as mudanças na paisagem e nas fisionomias. Os jovens de hoje são os filhos dos nossos ex-alunos, cujos pais são nossos contemporâneos dos tempos de jovem guarda e dos embalos de sábado à noite. Hoje, em visita à minha terrinha, somos apenas um rosto perdido na multidão [...]".